Conheça mitos e verdades sobre o micro-ondas

Você sabia?

Você certamente já ouviu falar um mundo de coisas desconexas sobre o forno de micro-ondas. Que faz mal à saúde, que dá câncer, que deixa a comida radioativa... Sem querer sabotar a teoria da conspiração, informamos que nada disso é verdade. Por outro lado, perceba só como certos fatos pouco comentados a respeito desse indispensável utensílio soam como pegadinhas, mas são a mais pura verdade.

Primeiro: saiba que o seu micro-ondas opera em uma frequência muito próxima a de outros aparelhos e redes que você usa para fins bem diversos: celulares, telefones sem fio, redes wifi, bluetooth... O micro-ondas opera em 2.450 MHz; o Wi-Fi, em 2.400 MHz. Alguns serviços de acesso à internet por rádio também usam faixas de 2.400 a 5.800 MHz.

"A diferença é a potência. A potência da radiação eletromagnética dentro do forno de micro-ondas é mil vezes maior do que a potência emitida por uma antena de Wi-Fi. Além disso, dentro do forno, ela fica confinada. A intensidade da radiação é maior no forno, mas fica só ali dentro, refletindo nas paredes do aparelho até que seja absorvida pelos alimentos e vire calor. Numa antena de celular ou de Wi-Fi, a radiação emitida se espalha, então a potência é bem baixa”, explica o professor Jorge Gut, associado ao Centro de Pesquisa em Alimentos (FoRC – Food Research Center) e docente do Departamento de Engenharia Química da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP). Estamos cercados pelo mesmo tipo de radiação usada nos fornos de micro-ondas. Sem ela não teríamos celular, Wi-Fi, bluetooth...

Por falar em potência, aí vai uma segunda revelação: no seu aparelho, lá na cozinha, você não regula propriamente a potência, mas apenas a proporção do tempo em que ele fica ligado e desligado. Resumindo: todos aqueles botõezinhos só regulam a função liga e desliga. Inclusive o botão de descongelamento.

“O forno de micro-ondas é um aparelho do tipo liga e desliga. Se prestar atenção no som, você consegue ouvir quando o emissor de micro-ondas liga, fazendo barulho, e desliga. A potência baixa significa que o emissor de micro-ondas fica mais tempo desligado do que ligado, e a potência alta significa que ele fica ligado durante 100% do tempo que leva o preparo do alimento. A potência intermediária é meio tempo desligado e meio tempo ligado. Isso porque é mais barato produzir um aparelho que só liga e desliga do que um eletrodoméstico em que o usuário realmente regula a potência da radiação emitida. Ou seja: o que a gente regula é a proporção de tempo que ele fica ligado e desligado.”

Bem, se é assim, para que serve aquele prato giratório? Segundo o professor, para minimizar um problema que tem origem no tamanho e nas características das micro-ondas. Ele diz que a radiação eletromagnética do tipo micro-ondas pode ter um comprimento de onda entre 1 mm e 1 m e que a radiação, na frequência em que é usada no forno doméstico (2450 MHz), tem ondas de 12 cm. “Essas ondas têm dois picos de intensidade entre os quais há um ponto de intensidade zero. Então, pelo tamanho e pelas características da onda, ela não aquece o alimento uniformemente ao se propagar dentro dele. Ela tem pontos de maior e menor intensidade de potência, com uma distância de 6 centímetros entre eles, o que causa no alimento uma sucessão de regiões quentes e frias, quentes e frias ... Nesses pontos frios, o alimento não esquenta, o queijo não derrete... O prato giratório existe para minimizar esse problema. Não resolve completamente, mas ajuda muito. Uma boa dica é parar o forno, abrir, mexer ou virar o alimento, e ligar de novo”, explica Gut. 

Água e gelo – No processo de aquecimento ou cozimento por micro-ondas, as moléculas de água presentes no alimento absorvem a radiação emitida pelo aparelho. Quanto mais água tiver o alimento, mais rápido ele aquece ou cozinha. “Por isso, quando você coloca um prato com batata e bife, a batata vai esquentar mais rápido: ela tem mais água.” 

Gut ressalta que, num alimento úmido, a radiação penetra a uma profundidade de apenas 1 ou 2 cm, porque a água vai absorvê-la. “Se você colocar um alimento muito grande, ele não vai esquentar no meio. Por isso, quando for fazer algo no micro-ondas, é melhor quebrar em pedaços e espalhar. Isso serve para os alimentos com boa quantidade de água. Em um alimento oleoso ou seco, a radiação penetra mais profundamente. Isso vai depender da composição do alimento.” 

De acordo com ele, dentro do forno de micro-ondas, a água presente nos alimentos ferve quando a temperatura atinge 100 °C. “Quando a água ferve, fica cheio de vapor ali dentro. O interior do aparelho não vai secar, vai ficar úmido. Por isso, certos alimentos não ficam bons quando preparados no micro-ondas, se comparamos com o preparo num forno convencional. Neste, onde a temperatura média é de 180 °C, o ar quente passa pelo alimento e sai pela grelha, vai para fora, carregando umidade. No micro-ondas, a umidade fica presa lá dentro e a temperatura é bem mais baixa do que no forno a gás. Assim, quando você esquenta pizza, pão e afins, eles ficam com uma textura borrachuda.”

Mas, se a água absorve muito rapidamente a radiação, o mesmo não acontece com o gelo, que não a absorve direito. “A molécula de água vibra com a radiação. No gelo, a molécula de água está presa em um cristal, não tem como se mexer muito. Por isso, o botão descongelar é o de potência mais baixa. Ele vai irradiando o alimento aos poucos, para que o calor se espalhe e o alimento descongele uniformemente. Quando o gelo forma água líquida, aquele pouquinho de água vai absorver radiação rapidamente. É por isso que às vezes acontece de você colocar um alimento congelado no micro-ondas e, quando tira, uma parte dele está congelada e a outra em ebulição. A água líquida rouba toda a radiação e a parte congelada não aquece mais”, resume Gut. 

Radiação eletromagnética – Segundo o professor, não há possibilidade de um alimento feito no micro-ondas “fazer mal à saúde”. O único risco que se corre, brinca ele, é que a comida não fique tão saborosa quanto ficaria ao ser cozida em um forno convencional.

A confusão neste caso, acredita ele, deriva do fato da palavra radiação ser usada para designar coisas diferentes. No forno do micro-ondas, usa-se radiação eletromagnética, que é um tipo de energia que se propaga no espaço, como a luz, por exemplo. Há tipos de radiação eletromagnética que têm mais ou menos energia do que a luz que conseguimos perceber, ou a luz visível, como é chamada (ver diagrama abaixo). As que têm mais energia são as radiações ultravioleta, os raios X e os raios gama. 

“Todas elas conseguem provocar alterações químicas em moléculas, por isso, são perigosas para a saúde e devem ser usadas com cuidado. Abaixo do nível de energia da luz visível vêm o infravermelho, as micro-ondas e as ondas de rádio, que não conseguem alterar moléculas. A diferença do infravermelho para as micro-ondas é que a radiação infravermelha não penetra nos corpos, ela é absorvida na superfície. Nós a sentimos quando tomamos sol, já que boa parte da radiação que vem do sol é infravermelho. O controle remoto da TV, por exemplo, usa infravermelho para se comunicar com o aparelho. Já as micro-ondas e ondas de rádio são muito usadas para outras formas de comunicação.”

radiaçao

Fonte: Yuri Tungsten - Trabalho derivado de Philip Ronan, CC BY-SA 3.0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=63356732
 

Entretanto, existe um outro tipo de radiação, que é a radiação nuclear. Ela ocorre em materiais naturalmente radioativos que emitem partículas contaminantes, daí a necessidade de isolamento dos rejeitos de usinas nucleares, por exemplo. “Um reator nuclear, que opera com urânio, gera lixo radioativo. São partículas que têm massa e podem contaminar os materiais, o ambiente. Acontece que, para designar o tipo de energia emitida por esses materiais, usa-se a mesma palavra: radiação. E isso gera uma confusão”, crê o professor. 

Não custa repetir – Apesar de você não ter a menor possibilidade de ficar doente porque comeu um alimento feito no micro-ondas, há certos cuidados no uso do aparelho que não custa nada repetir. Primeiro: nunca ligue o aparelho sem algo dentro. As ondas emitidas não serão absorvidas e ficarão refletindo ali dentro até voltarem para a fonte emissora, o que pode danificar o eletrodoméstico.

Segundo: metal, nem pensar. “Se você colocar uma colher de metal no micro-ondas e ligar, vai surgir uma corrente elétrica dentro do metal. Só que, como a potência é muito alta, vai sair faísca, porque a corrente será intensa. Mas isso é por causa do formato do material que está sendo colocado ali: materiais finos e pontudos tem maior chance de gerar faíscas, o que pode danificar o eletrodoméstico.”

Terceiro: se for colocar um recipiente de plástico, certifique-se de que ele pode ser usado no micro-ondas. “Há plásticos que, como a água, também absorvem radiação. E estes não podem ser usados de jeito nenhum, pois atingem altas temperaturas e podem causar acidentes”, alerta o professor. O ideal é usar vidro ou cerâmica, que são materiais transparentes às micro-ondas. 

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