Corantes: matizes de uma polêmica

Diferentemente do que se imagina, os corantes mais utilizados em alimentos são naturais; saiba mais em nossa matéria da série especial Aditivos Alimentares desta semana.

Séries especiais

Indigotina, betalaína, azorrubina, litolrubina, carmim de cochonilha … Esses são alguns nomes de corantes alimentícios encontrados nos rótulos dos produtos industrializados que consumimos. E que para a maioria de nós, além de não significarem nada, só geram dúvidas: fazem bem ou mal à saúde? A polêmica é antiga e parece não ter fim. Enquanto em um país uma determinada substância foi banida, em outro, ela continua liberada. E o problema não se limita aos sintéticos, pois há diversos estudos científicos que associam alguns corantes orgânicos naturais a alergias e outras doenças.

“O fato é que não há como a indústria deixar de usar corantes, pois a cor é um fator importante nas qualidades sensoriais percebidas pelo consumidor nos alimentos”, diz Eliana Bistriche Giuntini, pesquisadora do FoRC. E não se trata apenas de efeito decorativo. “Os corantes são usados para corrigir perda da cor no processamento ou armazenamento e até proteger aromas e vitaminas de perdas causadas pela exposição à luz”, revela.

De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), há quatro classes de corantes: os orgânicos naturais (extraídos de substância vegetal ou animal – classe funcional C-I); os orgânicos sintéticos idênticos aos naturais (classe funcional C-II); os orgânicos sintéticos artificiais (síntese química, classe funcional C-III); e os inorgânicos (classe funcional C-IV).

Os mais utilizados – Os mais utilizados são os orgânicos naturais, como extratos de urucum, carmim de cochonilha, curcumina, antocianinas e betalaínas. Entre eles, se destacam as antocianinas – compostos bioativos presentes em frutas e hortaliças com cores que variam do vermelho ao azulado. Mais de 635 antocianinas já foram identificadas na natureza. Outro pigmento muito utilizado pela indústria de alimentos é o beta-caroteno (um carotenóide) produzido e extraído de microalgas e cianobactérias, que dá aos alimentos cores que variam do creme ao alaranjado.

Diversos estudos experimentais, tanto com modelo animal quanto ensaios clínicos em seres humanos, têm indicado que algumas dessas substâncias possuem propriedades anti-inflamatória e anticancerígena, e podem estar envolvidas na redução de risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares, obesidade e diabetes em função de sua capacidade antioxidante.

“Na última década, uma pesquisa desenvolvida em conjunto Brasil-França apontou o caju como uma fonte de pigmento amarelo natural. O resíduo da extração do suco de caju contém carotenoides que proporcionam uma cor única, amarela clara. Alguns carotenoides são precursores de vitamina A, mas mesmo os que não possuem essa característica também são considerados bioativos, ou seja, são compostos com atuação em atividades biológicas importantes, que podem estar relacionadas à redução de risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer, além de degeneração macular e catarata. Assim, muitos corantes naturais poderiam também estar contribuindo com algumas funções biológicas do corpo humano, mas a quantidade utilizada é pequena”, afirma Eliana. 

Há também os corantes inorgânicos, que são obtidos a partir de substâncias minerais, purificadas de forma adequada. São eles dióxido de titânio (que confere cor branca - INS 171), óxido de ferro (preto, amarelo, vermelho - (INS 171i, INS 171ii, INS 171iii), alumínio (INS 173), prata (INS 174) e ouro (INS 175). Estes três últimos são usados em superfície de confeitos.

Cinco corantes não têm limitação de quantidade de uso estipulada pela Anvisa (Boas Práticas de Fabricação, 2010): Clorofila (INS 140i); Caramelo I – simples (INS 150a); Vermelho de beterraba – betanina (INS 162); Carbonato de cálcio (INS 170i) e Dióxido de titânio (INS 171). Os 3 primeiros são orgânicos. Eliana explica que eles não têm limites porque a toxicidade é considerada muito baixa, ou porque são auto limitantes.

Sintéticos: uso restrito

O uso dos corantes sintéticos é bastante restrito e, no mundo todo, menos de 20 são permitidos. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) permite apenas 16, conforme consta no Informe técnico 86, de 2015. Esses 16 corantes são classificados pela agência como orgânicos sintéticos idênticos aos naturais (classe funcional C-II) e orgânicos sintéticos artificiais (síntese química, classe funcional C-III).

Veja alguns exemplos de corantes sintéticos:

tabela corantes

O que você precisa saber sobre os corantes

  1. Se for utilizado corante artificial no alimento, a expressão “Colorido Artificialmente” deve constar no painel principal do rótulo: (Decreto-Lei n. 986, de 21 de outubro de 1969). 
  2. Quando o corante tartrazina (INS 102) estiver presente na lista de ingredientes de qualquer produto alimentício, seu nome deve ser declarado por extenso, ou seja: ele não pode ser identificado apenas pelo código INS. Isso por que a substância é apontada como uma das grandes causadoras de reações alérgicas, dermatológicas e respiratórias.
  3. Se você ler no rótulo “Sem Corantes Artificiais”, isso não significa que o corante é 100% natural. Pode ser um sintético idêntico ao natural.
  4. Atenção para os produtos que não podem receber corantes de nenhum tipo: açúcar; adoçantes; alimentos à base de cereais para crianças; carnes frescas; cereais processados (farinhas) e alguns derivados – massas para pasteis, pizza e massas com vegetais; frutas (embaladas in natura, secas, cristalizadas); água de coco; vegetais (embaladas in natura, descascados e/ou picados, secos, conservas, polpa e purê); cremes de leite e leites (concentrado, condensado, pó, esterilizado, evaporado); a maior parte dos queijos e preparados à base de queijo; produtos de cacau (chocolates, coberturas, pó); xaropes para panificação e produtos de confeitaria; condimentos vegetais, molhos à base de tomate, ketchup, sais; produtos de ovos; pescados e frutos do mar; além de pães.
  5. Há outros produtos que não podem receber adição de corantes artificiais: cervejas; bebidas alcoólicas fermentadas e destiladas (exceto para aguardente de vinho, grappa e pisco); embutidos; produtos secos, curados ou maturados; conservas à base de carnes; massas secas com e sem ovos (sem vegetais), com ou sem recheio; massas frescas sem vegetais; geleias de frutas e mocotó; doces de frutas ou vegetais; suco, néctar e polpa de fruta; frutas em conserva; manteiga, queijo tipo prato; maionese; condimentos preparados; vinagre; creme vegetal e margarina; óleos e gordura; produtos e massas com fermento biológico ou fermentação natural, com ou sem recheio e/ou cobertura.
  6. Nos alimentos em que o uso de corantes é facultado, pode ser utilizado mais de um tipo, desde que cada um esteja dentro do máximo permito e que a quantidade total não exceda à do corante que tenha maior quantidade permitida. 


Curiosidade

O angkak, ou koji vermelho, arroz transformado pelo fungo Monascus, parece ser o mais antigo corante conhecido e é usado na Ásia em produtos de carne e de peixes há séculos. Corantes como ele, obtidos via biotecnologia a partir de bactérias, microalgas e fungos, são utilizados no Oriente há centenas de anos.

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Imagem: Pixabay/atribuição não requerida

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