Uso de mapeamento genético para formulação de dietas personalizadas é promissor, mas precoce

Pesquisador do FoRC destaca que faltam estudos científicos mais aprofundados sobre a influência dos alimentos na genômica.

Fronteira do conhecimento

Várias clínicas e sites de nutrição passaram a oferecer dietas sob medida, elaboradas a partir do mapeamento genético. Seguindo essa dieta, o paciente evitaria o surgimento de doenças crônicas cuja predisposição genética foi identificada no exame. “O problema é que ainda não há elementos científicos suficientes para que a genômica nutricional possa ser usada nas dietas personalizadas para prevenir o aparecimento de doenças”, destaca Thomas Prates Ong, pesquisador do FoRC e docente do Departamento de Alimentos e Nutrição da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP. 

Segundo ele, trata-se de um campo de estudo amplo e recente, que investiga a influência dos componentes dos alimentos no genoma. “Os alimentos, antes vistos apenas como fonte de nutrientes como gorduras, carboidratos, vitaminas e minerais, passaram a ser estudados pela ciência como fontes de um grande número de outros componentes com potencial de prevenção de doenças crônicas. É o caso dos compostos bioativos, como os compostos fenólicos e as antocianinas”, diz Ong. “Sabemos que esses compostos bioativos têm capacidade de afetar a forma como nosso genoma funciona, e, dependendo como isso acontece, haverá efeitos na saúde ou no desenvolvimento de uma doença”, completa.

Como esses compostos atuam no genoma é a questão que move cientistas do mundo. “Se compreendermos como eles afetam o funcionamento do nosso genoma, poderemos, por exemplo, escolher alimentos que possam modulá-lo de forma mais benéfica. Mas ainda estamos longe disso.”

Limitação dos testes – Além disso, há a complexidade do material genético. “Os testes genéticos são limitados, pois abrangem uma quantidade muito pequena de genes. Na maior parte dos casos, também não se sabe o que esses genes conseguem ‘contar’ sobre o paciente”, afirma Ong.

Cada indivíduo tem um arcabouço genético que é próprio dele. Embora sejam próximos, existe um nível de diferenciação do genoma de pessoa para pessoa que é estimado em 0,1%. “Pode parecer pouco, mas é muito se considerarmos que nosso DNA tem 3 bilhões de bases.” Além disso, existem variações entre genomas que são bastante frequentes. É o chamado polimorfismo de nucleotídeo único – uma variação na sequência de DNA que afeta somente uma base [adenina (A), timina (T), citosina (C), ou guanina (G)] na sequência do genoma.

“Essas bases vão definir, por exemplo, a forma com que uma proteína será codificada para regular o metabolismo do colesterol. Se houver uma única alteração, uma base que deveria ser C e é um T, podemos ter uma alteração da estrutura tridimensional da proteína que vai mudar sua atuação para mais ou para menos. É possível que esse polimorfismo faça com que o organismo da pessoa produza mais colesterol endogenamente”, exemplifica.

Cada pessoa carrega cerca de 200 mil polimorfismos de nucleotídeo único. “Geralmente são mudanças na sequência de bases com impacto sutil, isoladamente falando, mas que na somatória podem fazer uma diferença muito grande. E já foram catalogadas mais de 10 milhões de variações”, aponta. Ele ressalta que para fazer um teste preditivo seria preciso conhecer, pelo menos, as mais importantes dessas variações, e ter condições de fazer testes em um preço razoável e com modelos estatísticos validados, que olhem o mapa genético do indivíduo e indiquem as propensões maiores a problemas. “Isso é algo muito difícil de fazer atualmente com o conhecimento de que dispomos.”

“Em resumo, embora promissores, ainda é cedo para a sua aplicação clínica. Dentre as limitações destacam-se o número pequeno de genes analisados, a falta de validação clínica e conhecimento quanto ao seu valor preditivo, ou seja, o quanto esses genes contam sobre a nossa saúde”, diz. A genômica nutricional ainda precisa de muita pesquisa”, afirma.

Um passo à frente:
A área de genômica, conta Ong, já vem sendo usada de forma bem-sucedida para outros fins. Pode ajudar a definir dosagens de medicamentos, mais adequadas a cada perfil genético, por exemplo. No caso da genômica nutricional, tem contribuído para mostrar como o organismo reage a determinadas substâncias. É o caso da cafeína que, dependendo da pessoa, acelera o metabolismo, aumentando a pressão arterial e os batimentos cardíacos a ponto de, no longo prazo, ampliar as chances de um infarto. “Hoje é possível, por exemplo, saber se uma pessoa metaboliza devagar ou rapidamente a cafeína. Não são muitos os genes envolvidos na metabolização da substância, o que facilita em relação aos exames genéticos.”

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