A castanha do Brasil, ou castanha do Pará, é a melhor fonte natural de selênio, um micronutriente que faz parte da estrutura de importantes proteínas antioxidantes no corpo humano. Mas o perfil genético de cada pessoa influencia a maneira como o organismo reage ao aumento dos níveis de selênio após uma suplementação com a castanha, de acordo com um novo estudo realizado na Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF) da Universidade de São Paulo (USP).
A descoberta reforça a importância de se considerar o perfil genético dos indivíduos na hora de definir uma intervenção nutricional, de acordo com a autora da pesquisa, a nutricionista Janaína Donadio, pós-doutoranda do Laboratório de Hematologia Clínica do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da FCF/USP.
A pesquisa de Janaína na área de genômica nutricional, com foco na nutrigenética, foi a base para sua tese de doutorado e já gerou duas publicações científicas. “A nutrigenética é uma área extremamente importante para a nutrição e tem como foco principal uma recomendação nutricional mais individualizada. O grande objetivo dessa pesquisa foi identificar se variações genéticas afetariam a resposta a uma intervenção nutricional”, disse Janaína.
Por dois meses, a pesquisadora acompanhou 130 pessoas saudáveis que receberam uma suplementação de uma castanha por dia em sua dieta normal. Depois, os voluntários deixaram de receber a suplementação e foram acompanhados por mais dois meses.
“Ao longo do processo, coletei o sangue dos voluntários uma vez por mês. Avaliei o DNA de todos eles e observei nove alterações, ou polimorfismos, em genes envolvidos com a codificação de proteínas que contêm selênio na sua estrutura – incluindo algumas importantes enzimas antioxidantes que não são bem estudadas”, explicou.
A principal função do selênio é formar a estrutura de certas proteínas. “As principais têm função antioxidante, mas o selênio também é importante para o metabolismo dos hormônios da tireoide, para as funções cerebrais e cardíacas, para a fertilidade masculina e para o sistema imunológico. Entretanto, deficiência de selênio é bastante rara”, disse a cientista. Em seu mestrado, ela já havia identificado uma série de marcadores que possibilitaram avaliar o estado nutricional dos indivíduos em relação à presença do selênio. No novo estudo, ela usou esses marcadores para avaliar os nove polimorfismos.
“O estudo mostrou que o perfil genético das pessoas influencia as diferentes respostas à suplementação. Em algumas pessoas com determinada variação genética, o selênio não subia tanto depois da suplementação. Isso indica que ela precisaria de quantidades maiores da castanha para ter a resposta desejada”, explicou Janaína.
Um dos resultados do trabalho, que avaliou marcadores relacionados ao perfil lipídico dos pacientes, foi publicado na revista científica European Journal of Nutrition. “Observamos uma redução do colesterol total e dos níveis de glicose no sangue durante a suplementação, mas os valores voltaram a subir quando a ingestão da castanha foi suprimida”, disse a pesquisadora.
Avaliações nutricionais personalizadas - Além dos marcadores de perfil lipídico, foram avaliados também cinco marcadores do estado nutricional relacionado ao selênio. Esse resultado gerou um artigo publicado na revista científica Clinical Nutrition. “Mostramos claramente que os marcadores sanguíneos também são afetados pelos polimorfismos”, disse Janaína.
De acordo com ela, também foi observado que a resposta de cada indivíduo à suplementação com selênio – isto é, a maneira como o organismo de cada um deles acumulou maior ou menor quantidade do micronutriente – mudou de acordo com as variantes que cada um possuía de um gene ligado à codificação de uma importante proteína que tem selênio em sua estrutura – a selenoproteína P”, disse a pesquisadora.
As castanhas utilizadas para a suplementação dos voluntários é a chamada Econut, da fazenda Aruanã, no Amazonas. Segundo Janaína, essa castanha tem uma concentração de selênio particularmente alta. Além da castanha-do-pará, outras fontes naturais de selênio são o ovo, o salmão, a sardinha, os cereais integrais, os brócolis e o alho.
Janaína afirma que a aplicação clínica da descoberta ainda está distante, mas o estudo indica claramente os impactos das variações genéticas na resposta à suplementação alimentar.
“Estudei uma gota no oceano, mas já temos uma indicação inequívoca de que a resposta dos indivíduos a uma dieta é diferente. Utilizei um só alimento e observei respostas totalmente diferentes. Cada indivíduo é um universo e não podemos mais achar que todos responderão igualmente às intervenções dietéticas. No futuro, espero que esses estudos contribuam para a revisão de recomendações nutricionais e que possamos nos aproximar de uma personalização cada vez maior das avaliações nutricionais”, declarou.
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Imagem: Pixabay/CC
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