Frutas mirtáceas: explorando a biodiversidade brasileira como uma estratégia na promoção da saúde

Confira neste artigo os benefícios dos frutos nativos brasileiros da família das mirtáceas

Educomunicação

Jarlei Fiamoncini
Professor do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da Faculdade de Ciências Farmacêutica das USP
Carlos Donado-Pestana
Pesquisador do Centro de Pesquisa em Alimentos

14/06/2021 -- A Organização Mundial da Saúde estabelece que a saúde humana depende, em grande parte, de produtos do ecossistema e de meios de subsistência produtivos, como a disponibilidade de água potável, alimentos e fontes de combustível. Por sua vez, doenças infeciosas como a da pandemia da Covid-19 emergem como fenômenos decorrentes de alterações extremas, que promovem o desequilíbrio das nossas interações com o ecossistema.

A biodiversidade desempenha um papel crucial na nutrição e saúde humana, na medida em que influencia a produção mundial de alimentos, garantindo a produtividade e qualidade dos solos, bem como recursos para as culturas agrícolas, pecuária e espécies marinhas destinadas à alimentação. Muitas espécies de plantas, pouco ou amplamente exploradas, possuem uma extensa quantidade de componentes químicos com propriedades nutricionais e funcionais, que podem promover a melhora da qualidade da dieta.

Na variedade de espécies encontradas na biodiversidade brasileira, os frutos da família das mirtáceas como a goiaba, jabuticaba, entre outros, são importantes na preservação e conservação da nossa fauna e flora. Comumente, as frutas mirtáceas possuem propriedades sensoriais atrativas devido a seu aroma e sabor. Apesar desses atributos, muitas espécies espalhadas pelos diversos biomas brasileiros são ainda pouco exploradas e estudadas, tais como o camu-camu, cagaita, cambuci, uvaia, apenas mencionando algumas em uma extensa lista de espécies. Componentes químicos presentes nesses frutos, como os chamados fenólicos ou polifenóis, têm demonstrado efeitos benéficos para a saúde, como a diminuição de alguns fatores de risco associados a obesidade e diabetes. Esses incluem a regulação dos níveis de açúcar no sangue e efeitos no controle de peso, como observado em experimentos com animais de laboratório e em estudos com humanos.

Os compostos fenólicos têm sido muito estudados e reconhecidos pelos seus efeitos antioxidantes em uma vasta variedade de alimentos comuns na dieta, tais como chá, vinho, soja, café etc. A adoção de dietas ricas em frutas e vegetais, como fontes de compostos fenólicos, tem demonstrado que podem contribuir para a melhoria da saúde e reduzir o risco do desenvolvimento de algumas doenças como diabetes, problemas cardiovasculares e até mesmo o câncer.

No caso específico das frutas mirtáceas, elas também podem ser consideradas fontes ricas de fenólicos, uma vez que muitas espécies crescem em condições ambientais adversas, como regiões suscetíveis a enchentes, secas ou à exposição excessiva de radiação solar. Essas condições promovem o acúmulo de compostos fenólicos e outras substâncias que auxiliam a planta na defesa contra tais fatores adversos. Interessantemente, esses compostos também podem regular processos no organismo humano de maneira benéfica à saúde, sempre que consumidos dentro de um estilo de vida saudável, incluindo o consumo de dietas equilibradas e a prática regular de atividade física.

Frutos nativos brasileiros da família das mirtáceas como cambuci, jabuticaba, cagaita e camu-camu, têm sido caracterizados pela presença de compostos fenólicos do tipo dos elagitaninos, proantocianidinas, flavonoides e ácidos fenólicos. Estes compostos têm demonstrado efeitos anti-inflamatórios, antioxidantes e moduladores do metabolismo energético de animais, mesmo quando alimentados com dietas ricas em açúcar ou gorduras saturadas e trans. Além disso, a ingestão de sucos obtidos desses frutos se mostrou eficaz em reduzir a concentração de açúcar no sangue, após o consumo de uma refeição simples, por indivíduos com alterações metabólicas decorrentes do sobrepeso e obesidade.

Além desses achados promissores, ainda há muito a ser explorado na rica biodiversidade de mirtáceas, que somam mais de 3.000 espécies e contam com uma representativa participação de variedades brasileiras. Ainda existem limitações relacionadas à caracterização fenólica dos frutos e estudos futuros devem levar em consideração sua procedência, tipos de solo, clima e períodos de colheitas. Além disso, a atividade biológica desses compostos pode ser avaliada não apenas na obesidade, mas também em outros tipos de doenças crônicas comuns na população, visando o estudo dos efeitos dos metabólitos originados dos compostos fenólicos formados após o consumo dos frutos, seus mecanismos de ação e a elucidação das bases moleculares que interferem nas suas atividades funcionais.

Referências
Araujo, R. L. de, Tomás-Barberán, F. A., Santos, R. F. dos, Martinez-Blazquez, J. A., & Genovese, M. I. (2021). Postprandial glucose-lowering effect of cagaita (Eugenia dysenterica DC) fruit juice in dysglycemic subjects with metabolic syndrome: An exploratory study. Food Research International, 142, 110209. https://doi.org/https://doi.org/10.1016/j.foodres.2021.110209
Donado-Pestana, C. M., Moura, M. H. C., de Araujo, R. L., de Lima Santiago, G., de Moraes Barros, H. R., & Genovese, M. I. (2018). Polyphenols from Brazilian native Myrtaceae fruits and their potential health benefits against obesity and its associated complications. Current Opinion in Food Science, 19, 42–49. https://doi.org/10.1016/j.cofs.2018.01.001
Morens, D. M., & Fauci, A. S. (2020). Emerging Pandemic Diseases: How We Got to COVID-19. Cell, 182(5), 1077–1092. https://doi.org/10.1016/j.cell.2020.08.021
Moura, M. H. C., Donado-Pestana, C. M., Rodrigues, L., Pessoa, E. V. M., Rossi e Silva, R., Festuccia, W. T., & Genovese, M. I. (2021). Long-term supplementation with phenolic compounds from jaboticaba (Plinia jaboticaba (Vell.) Berg) reduces adiposophaty and improves glucose, lipid, and energy metabolism. Food Research International, 143, 110302. https://doi.org/https://doi.org/10.1016/j.foodres.2021.110302
WHO, World Health Organization (2015). Connecting Global Priorities: Biodiversity and Human Health. A State of Knowledge Review.


compartilhar

Comentários