Fortificação x bio-enriquecimento de alimentos

Saiba as diferenças entre os dois e conheça alguns programas mandatórios de fortificação de alimentos no Brasil

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Segundo o Guidelines on Food Fortification with Micronutrientes, da Organização Mundial da Saúde (OMS) e da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), a fortificação é a prática de aumentar deliberadamente o conteúdo de um micronutriente essencial em um alimento, a fim de melhorar a qualidade nutricional da fonte alimentícia e fornecer um benefício para a saúde pública, com o mínimo de risco.

Na maioria das vezes, a fortificação tem como objetivo reduzir a carência de micronutrientes em uma população, ou em grupos populacionais específicos. Os micronutrientes são nutrientes necessários para a manutenção do organismo e que, embora requeridos em pequenas quantidades, devem estar presentes na dieta diariamente. Vitaminas e minerais fazem parte desta categoria.

De acordo com a OMS, há diversos tipos de fortificação, sendo os mais comuns a fortificação em massa (a adição de micronutrientes a alimentos muito consumidos pela população em geral é obrigatória por lei em alguns países, inclusive no Brasil); a fortificação destinada a populações-alvo (para grupos populacionais específicos, pode ser voluntária ou obrigatória); e a fortificação orientada pelo mercado (aquela realizada voluntariamente pela indústria). Outros tipos de fortificação são a fortificação caseira ou comunitária (que consiste na adição de uma mistura de vitaminas e minerais em pó em alimentos prontos para o consumo) e a biofortificação (técnica de melhoramento genético de sementes que possibilita elevar o teor de micronutrientes dos alimentos). 

A fortificação de alimentos é uma política pública em alguns países, como o Brasil, por exemplo. Aqui existem programas obrigatórios de fortificação de alguns alimentos há décadas. Um deles é a adição de iodo ao sal. Neste caso, o objetivo é a prevenção de bócio endêmico (hipertrofia da glândula tireoide), bem como de ocorrência de problemas mentais e outras patologias ligadas à deficiência de iodo.

A fortificação de farinhas de trigo e milho com ferro e ácido fólico é outro programa obrigatório no Brasil. Visa diminuir a deficiência de ferro, principal causa da anemia em crianças. Essa deficiência também compromete o desenvolvimento cognitivo e psicomotor; diminui a imunidade celular, que resulta em menor resistência às infecções; e ainda potencializa o risco de morbidades e mortalidade infantil e materna. 

Já a deficiência de ácido fólico (forma sintética dos folatos) pode provocar defeitos no tubo neural, como anencefalia e espinha bífida. O folato tem como algumas de suas atribuições a síntese, a replicação e o reparo do DNA e do RNA, além de exercer função na divisão celular. A adição de ferro às farinhas começou em 1999 como um passo facultativo diante do “Compromisso Social para Redução da Anemia Ferropriva”. Em 2001 foi sugerida a adição do ácido fólico.

“O problema de má formação de tubo neural, antes do programa de fortificação com ácido fólico, era muito grande no Brasil. Depois da fortificação a incidência diminuiu. Mas não vi muitos estudos sobre os efeitos dessa fortificação na população em geral, incluindo aquelas pessoas que não têm deficiência dessa vitamina. Se você tem uma dieta balanceada e ingere um alimento fortificado, pode estar ingerindo uma dosagem bastante elevada daquele nutriente”, pondera Marcela Albuquerque, bióloga que pesquisa a possibilidade de bio-enriquecer alimentos líquidos à base de soja com folato (vitamina B9) usando micro-organismos produtores da vitamina. 

Marcela atua na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo e está sendo orientada nesta pesquisa pela professora Susana Saad, uma das integrantes do Centro de Pesquisa em Alimentos (FoRC – Food Research Center) e co-orientada pelo Dr. Jean Guy LeBlanc, pesquisador no Centro de Referencia para Lactobacilos (Tucumán, Argentina). 

De acordo com ela, os métodos de fortificação de alimentos com vitaminas geralmente empregam a adição da forma sintética do nutriente. Já o bio-enriquecimento, através da fermentação realizada por micro-organismos benéficos e rigorosamente selecionados quanto à sua capacidade em sintetizar uma vitamina, permite produzir um alimento com quantidades elevadas desse nutriente em sua forma natural. “O bio-enriquecimento é uma alternativa à fortificação de alimentos com vitaminas sintéticas. É possível, através do uso de micro-organismos específicos e processos fermentativos, produzir um alimento nutritivo com alta quantidade do nutriente desejado e em sua forma natural como alternativa aos alimentos fortificados com o nutriente em forma sintética.”

Segundo ela, o organismo leva mais tempo para metabolizar o fortificante sintético e, consequentemente, demora mais para ter acesso ao nutriente. A vitamina em sua forma natural não acumula no organismo e não apresenta perigo de toxicidade.

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