Leite em pó é tão nutritivo quanto o pasteurizado e não tem conservantes

Além de facilitar a logística e a estocagem, produto tem durabilidade que varia de seis meses a três anos.

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Engana-se quem pensa que o leite em pó é menos nutritivo ou saudável do que o leite pasteurizado, aquele que é vendido refrigerado. O engenheiro químico Jorge Gut, pesquisador do Centro de Pesquisa em Alimentos (FoRC) e professor do Departamento de Engenharia Química da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), afirma que o processo de produção do leite em pó não afeta o valor nutricional do produto, uma vez que é feito a partir da desidratação do leite pasteurizado, com controle da qualidade da matéria-prima.

“Trata-se de um produto de alto valor agregado e de custos de produção elevados, dada a sofisticação do processo”, afirma. A indústria, explica ele, utiliza nesse processo um equipamento chamado de spray dryer, ou secador por atomização. Formado por uma torre oca com um atomizador instalado na parte superior interna, o leite é bombeado através de um bico pressurizado (ou por um disco rotativo), que gera uma névoa de gotículas bem pequenas do líquido. Correntes de ar quente se encarregam do processo de evaporação da água.

Processo complexo – “Em poucos segundos, as gotículas de leite secam e formam um pó fino. O ar quente carrega estas partículas do spray dryer para um ciclone. Neste equipamento o ar gira como em um furacão. Como as partículas de leite são mais pesadas do que o ar, elas são deslocadas para a parede do equipamento e escorregam para a parte debaixo do ciclone, onde se coleta o leite em pó, enquanto o ar quente sai pela parte de cima do ciclone”, descreve Gut. Um filtro é instalado para não deixar partículas escaparem para o ambiente. 

Por serem muitas finas, as partículas do leite passam por outro processo, chamado de aglomeração, para garantir que o produto final seja facilmente solúvel em água. “Neste processo, as partículas se espalham em uma ‘cama’, chamada de leito fluidizado. Depois, são movimentadas até formar uma nuvem suspensa do pó, sobre a qual se aplica vapor de água. Isso possibilita reumidificar as partículas e aumentar seu tamanho. Como resultado, a dissolução em água pelo consumidor é mais rápida”, explica a vice-diretora e coordenadora de Transferência de Tecnologia do FoRC, Carmen Tadini, professora titular do Departamento de Engenharia Química da Poli-USP. 

Segundo ela, a introdução do leito fluidizado resolveu um problema para as indústrias. “Antes, para melhorar a solubilidade do leite em pó na água, adicionava-se um emulsificante. O mais comum era a lecitina de soja, mas começaram a surgir casos de alergia. Esse novo processo, desenvolvido na Alemanha, eliminou a necessidade do emulsificante”, conta.

Vida de prateleira – O processo de oxidação dos lipídios, caso da gordura do leite, é o principal responsável pela deterioração do leite em pó, podendo causar alterações indesejáveis de cor, sabor e aroma. Trata-se de uma série complexa de reações químicas, que ocorrem em presença do oxigênio e os ácidos graxos insaturados dos lipídios.

Por isso, a presença ou ausência de gordura no leite em pó, assim como o tipo de embalagem, definem a durabilidade do produto. O leite em pó desnatado, armazenado em lata, tem validade de até três anos, já que praticamente não tem gordura. Já o leite integral pode ter validade de até seis meses.

As embalagens, por sua vez, não permitem que o oxigênio do ar penetre e também isolam o produto da ação da luz. Além disso, antes de fechar a embalagem na fábrica, seja lata ou saco plástico aluminizado, retira-se de dentro o ar (que contém oxigênio) e coloca-se o nitrogênio, que é um gás inerte. Sem a presença de oxigênio dentro da embalagem, são retardadas as reações de oxidação, aumentando o período de validade do produto. Tudo isso sem a adição de conservantes.

Você sabia?
O FoRC possui um spray dryer em escala piloto, que é usado para pesquisar novas aplicações do atomizador ou para testar a viabilidade do processo em diversos alimentos. O equipamento também dá respaldo às atividades de ensino, em uma disciplina do curso de Engenharia Química da Poli-USP. Recentemente, um grupo de pesquisa usou o equipamento para estudar o processo na secagem de extrato de café. Outra pesquisa verificou a viabilidade de transformar iogurte em pó. “São pesquisas importantes que geram avanços no conhecimento científico e que podem resultar em uma nova tecnologia para a indústria”, afirma a professora Carmen Tadini.

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