Fibras do chuchu aumentam a eficiência do processamento de lipídios por células do sistema imune

Pesquisadores do FoRC investigam como as fibras do chuchu e da banana interagem com as células do sistema imune antes de sua fermentação pela microbiota intestinal

Fronteira do conhecimento

Todo mundo já ouviu falar que fibras alimentares fazem bem à saúde. Vários estudos associam a ingestão de fibras à redução de risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares, diabetes, obesidade, câncer de cólon retal, síndrome do cólon irritável, constipação e diverticulose, entre outras. Ainda entre os possíveis efeitos fisiológicos benéficos das fibras consta a redução de colesterol total e/ou LDL (colesterol ruim) no sangue.

A fibra alimentar agrega vários compostos que não são digeridos pelas enzimas humanas. Ela atravessa todo o trato digestório incólume, e só é metabolizada pela microbiota intestinal, para quem serve de alimento (por isso, a maioria das fibras é considerada prebiótico). Mas um grupo de pesquisadores ligados ao Centro de Pesquisa em Alimentos (FoRC) vem investigando há algum tempo que tipo de efeitos a fibra alimentar pode ter no sistema imune antes de ser fermentada pelas bactérias.

“Geralmente, quando se consome uma fibra, ela vai funcionar como um substrato para as bactérias do intestino, que a partir dela irão produzir alguns metabólitos, entre eles os ácidos graxos de cadeia curta. Esses ácidos têm um efeito biológico já bem relatado, que chamamos de efeito indireto, e que é o mais conhecido das fibras. Mas, pensamos: a fibra vai atravessar todo o intestino interagindo com as células, sem ser metabolizada. Será que as células não conseguem reconhecer essas fibras? Será que não têm algum tipo de receptor para isso? Resumindo: será que não há um efeito biológico direto da ação das fibras em nosso organismo?”, relembra Victor Costa Castro Alves, pós doutorando do Programa Nacional de Pós-Graduação da CAPES e pesquisador ligado ao FoRC.

Para responder a essa pergunta, Castro Alves trabalhou com as fibras do chuchu e os macrófagos – células indispensáveis para o sistema imune, pois participam tanto da defesa do organismo contra patógenos como também têm um efeito sobre o metabolismo dos lipídios (óleos e gorduras). “O grande diferencial de nosso trabalho foi que não buscamos investigar os efeitos da interação entre fibras e macrófagos relacionados a infecções bacterianas, mas sim os relacionados ao metabolismo lipídico.”

A equipe descobriu que as fibras do chuchu conseguem aumentar a eficiência de processamento de lipídios pelos macrófagos. “O macrófago realiza o que chamamos de transporte reverso de colesterol: ele transfere o excesso de lipídio de novo para o fígado, para que seja reprocessado e excretado. Quando o macrófago chega no limite da quantidade de lipídios que consegue processar, transforma-se em uma célula espumosa, ou seja, um macrófago cheio de lipídio. Nesse momento, desenvolve-se uma cascata inflamatória: é assim que começa uma aterosclerose.”

Para chegar a essa conclusão, os cientistas cultivaram os macrófagos e inseriram lipídios nessa cultura. “Conseguimos ver a formação da célula espumosa e a produção de fatores pró-inflamatórios (citocinas). Então, colocamos as fibras nesse meio, e vimos a redução na quantidade de lipídios dentro da célula, bem como das citocinas pró-inflamatórias, produzidas por conta do excesso de lipídios”, explica o pesquisador, que está indo para a Suécia com uma bolsa de pós-doutorado.

Outras fibras – A equipe coordenada pelo Prof. João Roberto Oliveira do Nascimento, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas e pesquisador do FoRC, agora quer estudar os efeitos diretos de outros tipos de fibras, e Castro Alves começou a estudar a fibra da banana. “Cada tipo de fibra alimentar tem uma estrutura diferente. Pensamos que existe uma relação entre a estrutura da fibra e a interação com diferentes receptores das células do nosso corpo, induzindo efeitos também distintos. Estamos observando que existe uma relação forte entre a estrutura da fibra e o efeito biológico que ela induz”, adianta o pesquisador, salientando que os estudos sobre as fibras geralmente focam a quantidade ingerida, e não a qualidade da fibra alimentar.

Os cientistas estão desconstruindo a estrutura da fibra, uma molécula muito complexa, com centenas de açúcares ligados entre si, quebrando-a em pequenos pedaços e testando esses pedaços nos macrófagos. O objetivo de quebrar a fibra em pedaços menores é saber exatamente qual porção da fibra está interagindo com a célula e provocando efeitos. 

“A banana é uma fonte bastante consumida e tem uma variedade maior de fibras. Não sabemos ao certo quantos tipos, mas conseguimos identificar muito mais estruturas do que nas fibras do chuchu. Temos possibilidade de quebrar a fibra e obter mais fragmentos diferentes”, afirma Castro Alves.

Segundo ele, à medida em que se consiga identificar que determinadas estruturas podem interagir com células como os macrófagos ou células epiteliais induzindo efeitos benéficos, seria possível começar a pensar em estratificar essas porções de fibras como adjuvantes no tratamento de determinadas desordens que atingem diferentes camadas da população.

“É evidente que temos de estudar mais e entender mais um pouco, por isso estamos focando a estrutura da fibra. Se conseguirmos identificar que um pedaço específico da fibra do chuchu ou da banana – que pode estar presente em vários outros alimentos – tem um tipo específico de efeito, poderemos verificar quais são os frutos que têm um potencial para auxiliar no tratamento determinados tipos de desordens.” 

O trabalho de Castro Alves com a fibra do chuchu recebeu uma premiação na 7th International Dietary Fibre Conference 2018 – “Fibre Diversity in Food, Fermentation and Health”, que aconteceu entre 4 e 6 de junho de 2018 em Rotterdam, na Holanda.

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Imagem: Pixabay/CC

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