Consumo de fitoesteróis reduz colesterol em adultos, mas pode não ser seguro para crianças

Pesquisa da FCF-USP alerta que os efeitos dessa substância em crianças ainda precisam ser mais estudados.

Fronteira do conhecimento

24/05/2021 - Presentes em óleos vegetais, hortaliças, grãos e sementes oleaginosas, os fitoesteróis apresentam uma estrutura química semelhante ao colesterol e são conhecidos por sua capacidade de diminuir a absorção do colesterol LDL na digestão (popularmente conhecido como “colesterol ruim”). Como a dosagem alta dessa lipoproteína está associada à formação de placas de gordura nos vasos sanguíneos (aterosclerose), principal causa de doenças cardiovasculares, uma dieta rica em fitoesteróis poderia ajudar a prevenir esses problemas. Em tese, essa abordagem seria ainda mais eficaz caso essa dieta fosse introduzida já na infância, uma vez que o desenvolvimento das placas começa nesse período.

Porém, um estudo da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP) chama atenção para a necessidade de mais pesquisas para avaliar a real segurança do consumo de fitoesteróis por crianças. Coordenado pela professora Inar Alves de Castro, do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental, o trabalho foi feito com modelos animais com predisposição para aterosclerose. Todos os animais receberam uma dieta rica em gordura e um dos grupos foi suplementado com 0,76 mg diários de fitoesteróis, considerada uma dose alta para animais, durante os primeiros dois meses de vida. Depois, na fase adulta e já com aterosclerose, os animais que consumiram fitoesteróis apresentaram um nível de placas de gordura 2,7 vezes maior do que o grupo controle, ao contrário do que se esperava.

Segundo a pesquisadora, uma possível explicação para esse resultado é que indivíduos mais jovens absorvem muito mais fitoesterol do que adultos devido ao metabolismo acelerado – o que já foi demonstrado em outros estudos. A hipótese é que, ao ser absorvido em excesso, o fitoesterol pode agir da mesma forma que o colesterol LDL, induzindo a formação de placas nos vasos sanguíneos. “Nossos resultados, indicam que a alta absorção do composto na infância pode ser prejudicial. Isso é preocupante porque muitos produtos que são consumidos por crianças, como algumas linhas de margarinas e alguns tipos de leite, são suplementados com fitoesteróis”, afirma Castro.

Os pesquisadores também fizeram uma revisão de mais de 100 estudos. Nele, fica comprovada a eficácia dos fitoesteróis na redução do colesterol “ruim” em adultos, mas pouco se sabe sobre os efeitos desse composto em indivíduos mais jovens. Diante disso, os pesquisadores acreditam que a introdução de óleos vegetais e produtos enriquecidos com fitoesterol na dieta das crianças é algo que deve ser avaliado com cautela. “Para adultos não há problema, pois a absorção de fitoesteróis é muito baixa. Mas no caso das crianças, são necessários mais estudos para entender o metabolismo dos esteróis vegetais na infância e os seus efeitos a longo prazo, e se realmente o seu consumo seria recomendável e seguro”, conclui a professora.

Consumo por adultos – Apesar de apresentarem uma estrutura parecida com a do colesterol, os esteróis vegetais são moléculas com maior hidrofobicidade, ou seja, tem pouca afinidade com a água. Por isso, quando são ingeridos, eles são incorporados em uma micela – estrutura que apresenta moléculas solúveis e insolúveis simultaneamente. Assim, na presença dos fitoesteróis, o colesterol ingerido é deslocado na formação da micela, e acaba sendo excretado, dificultando sua absorção. “Além disso, quando ingerimos fitoesteróis na ausência de colesterol na dieta, também ocorre redução da absorção do colesterol endógeno, que faz parte da composição da bile. Esse colesterol é liberado no trato intestinal para ajudar na formação dessas micelas”, explica Inar Castro.

A literatura indica que, em geral, o consumo diário de 2 g de fitoesteróis pode reduzir o colesterol em até 10%. Do ponto de vista clínico, no entanto, essa redução não é tão significativa. Por isso, a suplementação de esteróis vegetais é geralmente usada para potencializar o efeito dos medicamentos que controlam os níveis de colesterol, como as estatinas. “Ao associar a medicação com fitoesteróis na dieta ou por suplementação, é possível ter um resultado mais efetivo e inclusive diminuir a dose do medicamento, reduzindo também seus efeitos colaterais”.

A pesquisadora esclarece que consumir mais de 2 g de fitoesteróis por dia não resultaria em uma maior redução do colesterol, já que, pelo próprio mecanismo fisiológico, existe um limite para essa redução. Também não há um limite de consumo diário desse composto para adultos, uma vez que a maior parte não é absorvida pelo organismo e, portanto, não apresenta riscos à saúde.

Fontes do composto – O brasileiro consome, em média, de 100 a 400 mg de fitoesteróis por dia. As principais fontes naturais de fitosterol são os óleos vegetais, especialmente de milho (909 mg/100 mL), girassol (411 mg/100 mL), soja (320 mg/100 mL) e oliva (300 mg/100 mL); sementes oleaginosas como amêndoas (183 mg/100 g); cereais como gérmen de trigo (344 mg/100 g) e farelo de trigo (200 mg/100 g); além de frutas e hortaliças, como maracujá (44 mg/100 g), laranja (24 mg/100 g) e couve-flor (40 mg/100 g).

Como a quantidade de fitoesterol nesses alimentos é pequena, para alcançar a dose indicada de 2 g por dia seria necessário aliar a dieta à suplementação ou ao consumo de produtos enriquecidos com esteróis vegetais. No Brasil, já existem no mercado produtos com essa característica, como uma margarina, que possui 0,8 g de fitoesterol por porção de 10 g; um iogurte, com 1,1 g por porção de 75 g; e um composto lácteo em pó, com 1,2g por 400 mL.

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